quinta-feira, 11 de abril de 2024

A CANTIGA É UMA ARMA

"Parva que sou" (2011)

Nas duas últimas edições de “A cantiga é uma arma”, propusemos um exercício de cidadania, com dois temas que refletem o “E depois do 25 de Abril?”: “Uns vão bem e outros mal”, uma canção de Fausto, de 1977, e “Eu vim de longe, eu vou p’ra longe”, de José Mário Branco, corria o ano de 1982.

A duas semanas da passagem dos 50 anos da Revolução dos Cravos, prosseguimos esta visita ao álbum das cantigas de sobressalto cívico, de inquietação, de inconformismo, em tempos de democracia.

Nesta viagem no tempo, podíamos ir ao encontro de Dino d'Santiago, de A Garota Não, da banda “Fado Bicha” ou de novos estilos como o rap

Na edição desta semana, a número 23 de “A cantiga é uma arma”, optamos, isso sim, por recuar a 2011, ao encontro dos “Deolinda”.

Quase quatro décadas depois do 25 de Abril, a banda de Ana Bacalhau dá voz à indignação de uma geração, através da canção “Parva que sou”, um tema não gravado, que foi interpretado pela primeira vez nos concertos nos Coliseus do Porto e de Lisboa, em janeiro de 2011.

Com o país mergulhado numa grave crise, que culminaria, poucos meses depois, no pedido de ajuda externa, de que resultaria a intervenção da chamada Troika, “Parva que sou” foi a senha que substanciou a revolta, a angústia, o desapontamento, a frustração de uma geração nascida e formada em liberdade, mas que, apesar de ser a mais bem preparada de sempre, parecia estar condenada a viver pior do que os seus pais.

Afinal, parecia ter sido enganadora a máxima de que convinha “estudar para ser alguém na vida”. Estávamos em janeiro de 2011 e aquilo que os jovens diplomados conseguiam eram empregos incertos e/ou funções desajustadas da sua formação universitária e com salários baixos. E, ainda por cima, havia o risco do conformismo e da apatia cívica. 


É neste contexto que surge a canção “Parva que sou”, um grito de cidadania na luta pela dignidade perdida: 

        “E fico a pensar: que mundo tão parvo

        Onde para ser escravo é preciso estudar.

        Sou da geração “vou queixar-me pra quê?”

        Há alguém bem pior do que eu na TV.

        Que parva que eu sou!”

A cantiga desta semana “não é uma canção datada. Não é uma canção de intervenção, de incentivo à agitação. É antes uma canção de revolta. Intemporal. Desalentada. De desapontamento pelos valores por que se lutou em (e pela) liberdade” (“Expresso”/ “Blitz”, 30/01/2022).

A duas semanas dos 50 anos do 25 de Abril, vale a pena (re)visitar “Parva que sou” e pensar, por exemplo, nos desafios que os jovens de hoje têm pela sua frente, em plena sociedade democrática nascida com a Revolução dos Cravos. Porque, como dizia Zeca Afonso, numa entrevista em 1985, “o que é preciso é criar desassossego.” 

Vamos, então, ouvir – e cantar – “Parva que sou”, com os “Deolinda” e a voz de Ana Bacalhau…

A Organização 

Sem comentários:

Enviar um comentário