“Verdes são os campos”
Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.
Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.
Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Luís de Camões, Lírica, fixação do texto de Hernâni
Cidade, Lisboa, Círculo de Leitores, 1980, p. 107.
Esta é uma
conhecida cantiga do ciclo da “menina dos olhos verdes”, em que o poeta exalta
a beleza da mulher amada e realça a ideia de que a verdura que o gado pasta é a graça dos olhos que
lhe enche o coração.
Num cenário bucólico, com a
paisagem a ser utilizada como uma metáfora para os sentimentos, o sujeito
poético compara os olhos da amada ao verde dos campos, dizendo que estes são como os olhos do seu coração. E assinala que,
tal como as ovelhas e os gados, também ele se alimenta, não da “verdura bela”
das ervas, mas, isso sim, das memórias da sua amada.
Aliás, a recordação feliz, ainda que saudosa e
nostálgica, da amada chega ao ponto da sintonia perfeita do “eu” lírico com os
gados que pastam, com contentamento:
“(…) Isso que
comeis
Não são ervas, não:
São graças dos
olhos
Do meu coração”.
Neste ambiente de
exaltação e de vassalagem da amada, dir-se-ia que a Natureza é bela na medida
em que participa das belezas da senhora.
O canto dos olhos
verdes traduz, por outro lado, uma forte originalidade. De facto, à época, o
ideal da beleza feminina considerava que os olhos mais belos eram os azuis.
Acontece que
diversos poemas de Camões são dedicados a uma destinatária de olhos verdes, uma
situação que “originou várias especulações biográficas”. Segundo Maria de
Lurdes Saraiva, “com segurança, só se pode afirmar que essa amada de olhos
verdes era de extrema juventude, uma criança que começava a entrar na vida”.
Com a primavera de
2025 a dar os primeiros passos, apetece ler e ouvir e cantar a simplicidade e a
beleza do amor, num ambiente bucólico.
“Verdes são os
campos” é um poema que Zeca Afonso musicou e cantou. Faz parte do álbum Traz outro
amigo também, editado em 1970. E, desde então, conheceu várias interpretações…
Vamos ouvir a
versão original: Zeca Afonso, “Verdes são os campos”, de Luís de Camões.
Boa primavera! Viva
a poesia…
Fonte: Luís de
Camões, Lírica Completa I, prefácio
e notas de Maria de Lurdes Saraiva, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda,
1980, pp. 160 e 166.
A Organização
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