sábado, 30 de agosto de 2025

NO 429.º ANIVERSÁRIO DA MORTE DE DIOGO BERNARDES

Diogo Bernardes e Camões: 

dois percursos quase nunca em sintonia!

Diogo Bernardes terá falecido a 30 de agosto de 1596, faz hoje, precisamente, 429 anos.

A propósito desta efeméride e ainda no contexto do V centenário do nascimento de Camões, propomos uma visita ao percurso destes dois vultos da nossa Literatura…

Bernardes e Camões são dois poetas contemporâneos. Afirmaram-se com grande prestígio no seu tempo, mas as relações entre ambos não foram muito amigáveis. 

Na década de 40 do século XVI, os ambientes palacianos da capital proporcionaram-lhes o primeiro contacto. Camões estava de regresso a Lisboa, depois de uns anos em Coimbra, onde consolidara a sua formação humanista. Bernardes, esse acabava de chegar da sua Terra da Nóbrega, à procura da fortuna. Nestes ambientes, exercitaram a poesia, ora fazendo elogios às senhoras, ora dando largas a improvisos jocosos sobre as questões da atualidade. Nestes jogos, todos procuravam vencer, exibindo o seu virtuosismo e graciosidade.

Sabe-se que Camões era repentista e mordaz, dotado de uma notável capacidade de improviso, pelo que não será difícil imaginar o aplauso que reunia junto das damas e dos cortesãos. “Isso trar-lhe-ia mais inimizades do que admiradores entre os seus pares”, escreve Isabel Rio Novo. E, entre eles, estava – certamente – o poeta barquense.

O destino, porém, depressa acabará por separá-los. Camões envolve-se em problemas, é desterrado, vai parar à prisão e a Ceuta, onde perde o olho direito. De novo em Lisboa, volta a ser preso e, em 1553, parte para o Oriente. Um ano depois, seria a vez de o infortúnio bater à porta de Bernardes, com a morte do jovem príncipe D. João, seu mecenas.

Camões regressaria à capital do império quase duas décadas depois, em 1570. E, em 1572, conseguiu a publicação d’”Os Lusíadas”, obra dedicada ao jovem rei D. Sebastião, a quem incita a liderar uma campanha no Norte de África.

Curiosamente, dois anos depois, saiu uma outra obra de pendor épico, da autoria de Jerónimo Corte-Real.  Acontece que, ao contrário d’“Os Lusíadas”, que não apresenta qualquer poema elogioso de outros homens de Letras, o trabalho de Corte-Real vem acompanhado de várias composições da elite literária da época – Bernardes incluído –, que, em uníssono, louvam a excelência da obra.  

O poeta barquense vivia, então, um período auspicioso. Em 1576, acompanha, como secretário, a embaixada de Pedro de Alcáçova Carneiro, enviada por D. Sebastião ao rei de Espanha. E, no ano seguinte, é despachado “moço de toalha” do monarca português que, depois, o escolhe para, como poeta oficial, cantar a sonhada vitória na Cruzada a Marrocos.

Camões sente-se ofendido. Também ele lutara por ser o cantor da jornada de África. Mas é preterido, ou porque D. Sebastião não lhe desse importância, ou “porque o achasse velho e debilitado, ou porque preferisse o poeta que também era seu servidor de toalha desde 1577, ou por todas estas razões” (Isabel Rio Novo).

A expedição parte de Lisboa, em finais de junho de 1578. A desorganização e a arrogância são de tal ordem, que só podiam dar mau resultado… E deram mesmo!

A aventura redundou na tragédia de Alcácer-Quibir, a 04 de agosto de 1578.

Mal recebeu a notícia, Camões rasgou os versos que tinha começado, quando a armada partira do Tejo. E, menos de dois anos depois, em 1580, perdeu a vida, tal como Portugal perdeu a independência. Bernardes, esse nem chegou a iniciar o poema épico. Feito prisioneiro, só conseguiu a liberdade dois ou três anos depois.

Camões por Fernão Gomes, em cópia de Luís de Resende.

Com a morte do autor d’”Os Lusíadas”, alguns dos seus contemporâneos começaram, entretanto, a mudar de opinião. É o que acontece também com o poeta barquense. Quando, em 1595, foi editada a lírica camoniana, com o título de “Rimas”, a obra incluiu um soneto seu, intitulado “Em louvor de Luís de Camões”, que “honrou a pátria em tudo”. E Bernardes termina com a glorificação póstuma do nosso épico:

“Mas se lhe foi Fortuna escassa em vida

Não lhe pode tirar despois da morte

Um rico emparo de sua fama e glória”.

Diogo Bernardes morreu a 30 de agosto do ano seguinte, faz hoje, precisamente, 429 anos. Pediu e foi sepultado junto de Camões, no Mosteiro de Sant’Ana.

Depois de tantos desencontros, Camões e Bernardes repousam, finalmente, em eterna sintonia!

Prof. Luís Arezes

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