sábado, 31 de maio de 2025

Campanha “Papel por Alimentos" promove cidadania

A Biblioteca Escolar do Agrupamento e a comunidade escolar em geral desenvolveram um trabalho muito importante na operacionalização da campanha “Papel por Alimentos”.

Ao longo do ano letivo, foram recolhendo papel e cartão, situação que, juntamente com um desbaste do fundo documental da BE, permitiu reunir uma quantidade significativa de material reciclável.

Em articulação com o Rotary Club de Ponte da Barca, as várias centenas de quilos de papel e cartão recolhidas foram, entretanto, encaminhadas para o Banco Alimentar Contra a Fome de Viana do Castelo.

Recorde-se que a campanha “Papel por Alimentos” é uma iniciativa promovida pela Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares, com contornos ambientais e de solidariedade: por cada tonelada de papel, é entregue aos Bancos Alimentares Contra a Fome o equivalente a 70 euros em produtos, a distribuir por instituições que prestam apoio aos mais carenciados.

Com esta ação, promoveu-se o exercício da cidadania e deu-se um contributo muito significativa para a consecução de vários dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas, mostrando que o papel de cada um é essencial na luta contra a fome e na promoção da sustentabilidade.

Biblioteca Escolar

quarta-feira, 28 de maio de 2025

Sandra Lima conta De onde vêm os abraços?

e encanta os mais novos

A magia da palavra e a força dos sentimentos/ emoção encheram de vida e de encanto os encontros que a autora Sandra Lima dinamizou com os alunos das Escolas Básicas de Entre Ambos-os-Rios e de Crasto.

Num ambiente de grande proximidade e envolvimento, a escritora apresentou aos mais novos a estória do seu livro de literatura infantojuvenil De onde vêm os abraços?, ilustrado por Bolota.


Foi uma experiência muito forte, através de uma viagem na companhia da protagonista, Nélia Regina, uma menina especial e muito feliz que tem uma forma própria de comunicar com a natureza e com quem a rodeia.

Através de uma dinâmica interativa, Sandra Lima partilhou esta história de afetos e de inclusão, ajudando a pequenada a descobrir de onde vêm os abraços pela mão de uma criança que tem numa árvore a sua mais profunda confidente e amiga, num mundo de silêncios.


Para além de um momento forte de formação afetiva e de educação ambiental, o encontro proporcionou ainda um contacto muito rico com a beleza expressiva dos códigos cénicos, tais como a exploração da palavra e da entoação da voz, o silêncio, a mímica, o movimento, os adereços…

Biblioteca Escolar

terça-feira, 27 de maio de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

Sete anos de pastor Jacob servia

Sete anos de pastor Jacob servia

Labão, pai de Raquel, serrana bela:

Mas não servia ao pai, servia a ela,

E a ela só por prémio pretendia.

 

Os dias, na esperança de um só dia,

Passava, contentando-se com vê-la:

Porém o pai, usando de cautela,

Em lugar de Raquel lhe dava a Lia.

 

Vendo o triste pastor que com enganos

Lhe fora assim negada a sua pastora,

Como se a não tivera merecida,

 

Começa de servir outros sete anos,

Dizendo: “Mais servira, senão fora

Para tão longo amor tão curta a vida”.

Luís de Camões, Lírica Completa II, prefácio e notas de Maria de Lurdes Saraiva, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1980, p. 168. 

Partindo do episódio bíblico apresentado no capítulo 29 do livro Génesis, que tem Jacob como protagonista, este soneto acaba por esquecer elementos menos comovedores da fonte de inspiração e, com grande sensibilidade, valoriza um sentido original, ao centrar-se na exaltação da constância do amor e da fidelidade a toda a prova.   

Jacob representa, de facto, uma personagem que ultrapassa todas as barreiras, a fim de merecer a pessoa que ama. Durante sete anos, “o triste pastor” serve Labão, na esperança de merecer Raquel como prémio desse trabalho, mas a sua esperança é enganada, pois o pai dá-lhe outra filha, chamada Lia.


Raffaello Sanzio, “Encontro de Raquel com Jacob” (1518-19)

Jacob não desiste e começa – ou recomeça – a servir Labão durante mais sete anos. As palavras finais do poema, pronunciadas emotivamente em estilo direto, manifestam, de uma forma magistral, o seu ânimo firme e decidido, o seu amor sólido e imutável:

“[…] Mais servira, senão fora

Para tão longo amor tão curta a vida”.

Num estilo simples e numa linguagem direta, o soneto afirma-se como uma autêntica narrativa da alma do povo. Citando Agostinho de Campos, dir-se-ia que “o moço minhoto, aldeão e analfabeto, que tenha pensado em emigrar para longe, com a esperança de voltar ao fim de anos e casar-se com a rapariga que ama, filha do lavrador mais rico da terrinha, chorará com certeza, se ouvir ler esses versos, porque os pode compreender e sentir de ponta a ponta”.

Esta simplicidade e fluidez narrativa terão, certamente, justificado a vasta receção que o poema teve, não só em Portugal, mas, sobretudo, em Espanha, a ponto de ser considerado um dos textos líricos mais célebres e imitados de Camões.

Carolina Michaëlis “estudou em especial as imitações que o poema originou em Espanha e, segundo afirma, o soneto, ainda antes da sua publicação na primeira impressão das Rimas, em 1595, foi espalhado em numerosos apógrafos pelos reinos de Espanha, tendo sido citado, traduzido e imitado por diversos autores”.

Teófilo Braga sustenta mesmo que “Sete anos de pastor Jacob servia” foi parafraseado pelo próprio Filipe II de Castela…

Sugerimos a audição do poema cantado por Amália Rodrigues. Faz parte do seu derradeiro álbum de originais, Obsessão, de 1990.

Fonte: Xosé Manuel Dasilva Fernández, “O soneto camoniano ‘Sete anos de pastor Jacob servia’ à luz do cânone editorial de Leodegário A. de Azevedo Filho”, em “O Marrare” – Revista da Pós-Graduação em Literatura Portuguesa. Disponível em http://www.omarrare.uerj.br/numero15/xosemanuel.html, acedido em 23/05/2025. 

A Organização

sexta-feira, 23 de maio de 2025

Entrega dos prémios do Concurso de Leitura

Foi num ambiente de festa e de celebração do livro e da leitura que aconteceu a sessão de entrega dos prémios do concurso de leitura que, ao longo do corrente ano letivo, mobilizou, no Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca, a Educação Pré-escolar (EPE) e os alunos do 2.º Ciclo.

Com o patrocínio da Câmara Municipal, a entrega aconteceu no âmbito da Feira do Livro do Município e, na EPE, contemplou os finalistas da EB Diogo Bernardes (1.º classificado), os finalistas da EB de Crasto (2.° classificado) e os finalistas da EB de Entre Ambos-os-Rios (3.° classificado).

Por sua vez, no 2.º Ciclo, os três melhores desempenhos foram conseguidos, respetivamente, por Ana Valentina Gomes, do 5.º ano, Lara Cerqueira, também do 5.º, e António Pereira, do 6.º ano.

Nas suas intervenções, tanto o Presidente da Câmara Municipal, Augusto Marinho, como o Diretor do Agrupamento de Escolas, Carlos Louro, felicitaram os participantes no concurso, dirigindo uma saudação especial aos que alcançaram os três primeiros lugares. Partilharam ainda palavras de reconhecimento e de aplauso aos professores, bibliotecas e famílias, pela atenção que dedicam à promoção do livro e da leitura.

Recorde-se que, na EPE, as crianças trabalharam a obra “Gilberto, o cão poeta, anima a festa!”, de Gisela Silva, com ilustração de Ireneu Oliveira, enquanto no 2.º Ciclo o livro escolhido para o concurso foi “O Menino-Estrela", de Oscar Wilde.

A Organização

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Sarau de Poesia: A Festa da Palavra bem dita

O auditório da Feira do Livro do Município de Ponte da Barca acolheu mais um Sarau de Poesia, atividade que constituiu uma verdadeira Festa da Palavra, bem dita e bem cantada.

Mobilizando alunos dos 1.º ao 12.º anos do Agrupamento de Escolas, familiares, amigos e professores e ainda alunos e o coro dos ensinos livre e articulado de música da Academia de Ponte da Barca, o sarau foi um momento de exaltação da Palavra, celebrando a língua de Camões, a propósito da passagem dos 500 anos do nascimento do épico, e também os valores da Revolução de Abril, cujo cinquentenário se continua a assinalar.  


Perante uma numerosa plateia, sempre atenta aos múltiplos desempenhos, dezenas de participantes deram voz à Poesia, partilharam emoções e sentiram a riqueza e a beleza da Arte.

Entre os presentes, estiveram o Presidente da Câmara Municipal, Augusto Marinho, e o Diretor do Agrupamento de Escolas, Carlos Louro, para além das vereadoras Rosa Maria Arezes e Diana Sequeira e da Coordenadora Interconcelhia da Rede de Bibliotecas Escolares, Carla Gandra.

Nas suas intervenções, Augusto Marinho e Carlos Louro felicitaram os participantes, respetivas famílias e a Biblioteca Escolar – organizadora do evento, em articulação com a Autarquia, a comunidade escolar e a Academia de Música de Ponte da Barca – e enalteceram a importância da leitura e o poder da Palavra, enquanto ferramentas que ajudam a interpretar o mundo e a vida com lucidez.

“Viva a Poesia!” é a mensagem que a todos continua a inspirar

A Organização

terça-feira, 20 de maio de 2025

SARAU POÉTICO

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

A Máquina do Mundo e Fernão de Magalhães

Eis aqui as novas partes do Oriente

Que vós outros agora ao mundo dais,

Abrindo a porta ao vasto mar patente,

Que com tão forte peito navegais.

Mas é também razão que, no Ponente,

Dum Lusitano um feito inda vejais,

Que, de seu Rei mostrando-se agravado,

Caminho há de fazer nunca cuidado.

 

[…] Mas cá onde mais se alarga, ali tereis

Parte também, co pau vermelho nota;

De Santa Cruz o nome lhe poreis;

Descobri-la-á a primeira vossa frota.

Ao longo desta costa, que tereis,

Irá buscando a parte mais remota

O Magalhães, no feito, com verdade,

Português, porém não na lealdade.

 

Desque passar a via mais que meia

Que ao Antártico Polo vai da Linha,

Dũa estatura quase giganteia

Homens verá, da terra ali vizinha;

E mais avante o Estreito que se arreia

Co nome dele agora, o qual caminha

Pera outro mar e terra que fica onde

Com suas frias asas o Austro a esconde.

             Luís de Camões, “Os Lusíadas”, X, 138; 140-141

No longo episódio da Ilha dos Amores, que representa cerca de vinte por cento d’”Os Lusíadas”, há vários momentos marcantes que reforçam o seu carácter simbólico de prémio “bem merecido” pelos “trabalhos tão longos” (IX, 88).

Depois do casamento entre as ninfas e os navegantes, com os nossos heróis a serem divinizados, isto é, elevados ao estatuto dos deuses, imortais – “esforço e arte / Divinos os fizeram, sendo humanos” (IX, 91) –, acontece um banquete, durante o qual uma “bela ninfa” canta os futuros feitos dos Portugueses.

Téthis conduz, então, Vasco da Gama ao cimo de um monte, onde lhe mostra a chamada “máquina do Mundo”, revelando-lhe, no orbe terrestre, os lugares onde os lusos hão de praticar grandes obras e o que será o Império Português.


Nesta visão, surge o grande feito da viagem de Fernão de Magalhães, o herói cujas origens estão em Paço Vedro de Magalhães, concelho de Ponte da Barca.

Português no feito, mas “de seu Rei mostrando-se agravado”, será ao serviço de Castela que Magalhães “caminho há de fazer nunca cuidado”.

E, em Puerto de San Julián, verá homens de uma “estatura quase gigantesca”, os nativos  de pés enormes, a que o navegador chamou “Patagónios” ou “Patagões”, termo que estaria na origem da designação da região onde se encontravam, a Patagónia, bem lá no sul do continente americano.

Até que, “mais avante”, há de descobrir, ao longo de novembro de 1520, a passagem para o outro lado, através de um “Estreito que se arreia / Co nome dele agora”, o famoso  “Canal de Todos-os-Santos”, agora dito “Estreito de Magalhães”. E, chegados ao “outro mar”, que estava calmo, “Pacífico” lhe chamou, nome que substituiria o de Mar do Sul, que Balboa lhe dera, quando o avistara, uns anos antes, no Panamá.

Estamos perante o auge da glorificação: “comovido / De espanto e desejo” (X, 79), Vasco da Gama vê o que só aos deuses é dado ver. É a glorificação simbólica do conhecimento, do saber proporcionado pelo sonho da descoberta.

Ao ser elevado acima das categorias do tempo e do espaço e ao ser proclamado senhor do “Saber, alto e profundo, / Que é sem princípio e meta limitada” (X, 80), o herói recebe a coroação máxima. Com esta iniciação ao conhecimento ou Sapiência Suprema do Universo, passa do mundo profano, vulgar, para um mundo sagrado.

O “bicho da terra tão pequeno” (I, 106) vence, afinal, as suas próprias limitações e vai além “do que prometia a força humana” (I, 1), num verdadeiro hino ao orgulho humanista do Renascimento.

Podemos, igualmente, aproximar a máquina do Mundo da temática amorosa. De facto, o Amor é a força capaz de corrigir o caos e de restabelecer a Harmonia e, por isso, guiado por Téthis e pela força do Amor para contemplar a “máquina do Mundo”, o “felice Gama” (X, 75), agora divinizado, ouve o convite da deusa:

“Faz-te mercê, barão, a Sapiência

Suprema de, cos olhos corporais,

Veres o que não pode a vã ciência

Dos errados e míseros mortais” (X, 76).

Cabe ao homem, por meio de seus esforços, por meio do Amor, impor a si e àquilo que está em seu redor uma visão ordenada da Vida…

A Organização

quarta-feira, 14 de maio de 2025

Exposição celebra património 

de Camões e de Vasco da Gama

“Celebrando Vasco da Gama e Luís de Camões: o canto da viagem de Belém a Calecute” é o título da exposição que está patente ao público no átrio do bloco C da Escola Secundária de Ponte da Barca.

Inserida no âmbito das celebrações do V centenário do nascimento de Camões (1524-1580) e do V centenário da morte de Vasco da Gama, que aconteceu em Cochim (Índia), no dia 24 de dezembro do ano em que nasceu o nosso épico, a exposição centra-se na viagem da armada de Gama à Índia (1497-1498), “por mares nunca de antes navegados” (“Os Lusíadas”, I, 1), e no seu forte impacto global, na medida em que deu “novos mundos ao mundo” (II, 45) e ofereceu à Humanidade horizontes até aí impensados.

A caminho dos 527 anos da chegada da armada à Índia, que terá acontecido a 20 de maio de 1498, a mostra apresenta uma visita guiada a esta aventura, desde a partida no Restelo, em Lisboa, a 8 de julho de 1497, tendo como orientação o texto d’”Os Lusíadas”.

De facto, no seu projeto de exaltação do “peito ilustre lusitano” (I, 3), Camões escolheu este feito grandioso para ser a trave-mestra da sua epopeia, a ponto de a narração da viagem ocupar vários cantos da epopeia.

Na sessão de abertura participaram o Diretor do Agrupamento, Carlos Louro, e ainda Guilherme Silva, aluno do 12.º ano que faz parte do Conselho Geral. Nas suas intervenções, falaram da importância da viagem e do seu impacto científico e cultural e também da força do sonho e da resiliência para levar a cabo projetos relevantes.

Organizada pela Biblioteca Escolar, com recurso a materiais produzidos pela Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, a mostra contou com a preciosa colaboração das assistentes operacionais em exercício no bloco C.

Biblioteca Escolar 

terça-feira, 13 de maio de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES


Bem-vindos à Ilha dos Amores, morada dos heróis

Mas a Fama, trombeta de obras tais,

Lhe deu no Mundo nomes tão estranhos

De Deuses, Semideuses, Imortais,

Indígetes, Heróicos e de Magnos.

Por isso, ó vós que as famas estimais,

Se quiserdes no mundo ser tamanhos,

Despertai já do sono do ócio ignavo,

Que o ânimo, de livre, faz escravo.

 

E ponde na cobiça um freio duro,

E na ambição também, que indignamente

Tomais mil vezes, e no torpe e escuro

Vício da tirania infame e urgente;

Porque essas honras vãs, esse ouro puro,

Verdadeiro valor não dão à gente:

Milhor é merecê-los sem os ter,

Que possuí-los sem os merecer.

 

[…] E fareis claro o Rei que tanto amais,

Agora cos conselhos bem cuidados,

Agora co as espadas, que imortais

Vos farão, como os vossos já passados.

Impossibilidades não façais,

Que quem quis, sempre pôde; e numerados

Sereis entre os Heróis esclarecidos

E nesta «Ilha de Vénus» recebidos.

                Luís de Camões, Os Lusíadas, IX, 92-93; 95.

Depois de várias dificuldades em Calecute, os Portugueses iniciam a viagem de regresso à Pátria. Estamos em finais de julho de 1498.

É então que Vénus decide dar um prémio “bem merecido” aos corajosos navegadores pelos “trabalhos tão longos” (IX, 88), “Por mares nunca de antes navegados” (I, 1). Fá-los aportar a uma ilha paradisíaca, uma “ínsula divina” (IX, 21), povoada de ninfas amorosas que lhes deleitam os sentidos. Numa atitude estudada de sedução, as divindades fingem assustar-se com a presença dos marinheiros, mas logo se rendem aos encantos do amor.

Pintura de António Fernandes – Ilha dos Amores (Salão Camoniano) 

Esta ilha “alegre e deleitosa” (IX, 54) não existe na realidade, mas na imaginação, no sonho que dá sentido à vida. O sonho que permite atingir a plenitude da Beleza, da Harmonia, do Amor, da Realização.

A grandeza épica da viagem também se mede pela grandeza do prémio, e esse foi o da imortalidade, simbolicamente representada na união homens-ninfas, fazendo-se juras de “eterna companhia, / Em vida e morte, de honra e alegria” (IX, 84). Quer dizer, os Portugueses deixam de ser simples mortais, transcendem a condição humana e recebem os dotes de uma experiência divina – são heróis: “[…] esforço e arte / Divinos os fizeram, sendo humanos” (IX, 91).

É a energia criativa do Amor que conduz os Portugueses à imortalidade. Não um amor qualquer, mas o Amor desinteressado, o Amor à pátria, o Amor ao dever, a capacidade de suportar todas as dificuldades, todos os sacrifícios. É esse Amor que liberta da "lei da morte".

Na Ilha dos Amores, temos a glorificação do “peito ilustre lusitano”, a vitória do génio humano e ainda a embriaguez dos sentidos. A Ilha é também a manifestação da Beleza de um mundo ideal, onde todos os que merecem são compensados pelo seu esforço, um mundo onde, lado a lado, se conjuga o terreno e o divino, o carnal e o espiritual. Ela é o restabelecimento da Harmonia, de modo que a consagração e a transfiguração mítica dos heróis apontam para a recolocação do Amor como centro da Harmonia e do Mundo.

Este regresso ao paraíso perdido remete, naturalmente, para a questão da autodeterminação humana e do orgulho humanista. A deificação dos homens elevados ao estatuto de deuses é uma ideia adequada ao impulso do Renascimento, que assistiu a um importante avanço no domínio do planeta por parte do Homem.

Assumindo a sua missão humanista, o Poeta, de forma pedagógica, não perde ainda o ensejo de tecer considerações sobre a forma de alcançar a Fama, ao exaltar o perfil dos que podem ser “nesta ‘Ilha de Vénus’ recebidos”, reiterando a importância de valores como a justiça, a coragem, o amor à Pátria, a lealdade ao Rei:

“Por isso, ó vós que as famas estimais,

Se quiserdes no mundo ser tamanhos,

Despertai já do sono do ócio ignavo,

Que o ânimo, de livre, faz escravo.

 

E ponde na cobiça um freio duro,

E na ambição também, que indignamente

Tomais mil vezes, e no torpe e escuro

Vício da tirania infame e urgente;”

Tudo isto porque tais honrarias vãs não dão valor a ninguém: melhor é merecê-las sem as ter do que possuí-las sem as merecer…

A Organização

terça-feira, 6 de maio de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

O caminho da fama e da  glória

Por meio destes hórridos perigos,

Destes trabalhos graves e temores,

Alcançam os que são de fama amigos

As honras imortais e graus maiores;

Não encostados sempre nos antigos

Troncos nobres de seus antecessores;

Não nos leitos dourados, entre os finos

Animais de Moscóvia zibelinos;

 

Não cos manjares novos e esquisitos,

Não cos passeios moles e ouciosos,

Não cos vários deleites e infinitos,

Que afeminam os peitos generosos;

Não cos nunca vencidos apetitos,

Que a Fortuna tem sempre tão mimosos,

Que não sofre a nenhum que o passo mude

Pera algũa obra heróica de virtude;

 

Mas com buscar, co seu forçoso braço,

As honras que ele chame próprias suas;

Vigiando e vestindo o forjado aço,

Sofrendo tempestades e ondas cruas,

Vencendo os torpes frios no regaço

Do Sul, e regiões de abrigo nuas,

Engolindo o corrupto mantimento

Temperado com um árduo sofrimento.

Luís de Camões, Os Lusíadas, VI, 95-97.

Depois de múltiplos contratempos, traições e perigos, a armada portuguesa, guiada pelo piloto melindano, avista Calecute, na Índia. A missão está cumprida e Vasco da Gama agradece a Deus:

(…) Os joelhos no chão, as mãos ao Céu,

A mercê grande a Deus agradeceu” (VI, 93).


Concluída, epicamente, a viagem, o Poeta, assume, então, o seu papel humanista e intervém, de forma pedagógica.

Defende um novo conceito de nobreza, espelho do modelo da virtude renascentista: a fama e a imortalidade, o prestígio e o poder, adquirem-se pelo esforço pessoal – enfrentando batalhas e tempestades, desafiando “hórridos perigos”, suportando sacrifícios e privações, “Engolindo o corrupto mantimento / Temperado com um árduo sofrimento”.

Não se é grande, nobre, imortal, por herança, permanecendo no luxo e na ociosidade, nem pela concessão de favores se deve alcançar lugar de relevo. Pelo contrário! O verdadeiro valor das honras e da glória está em serem conseguidas por mérito próprio. O herói faz-se pela sua coragem e virtude, pela generosidade da sua entrega às grandes causas:

“Por meio destes hórridos perigos,

Destes trabalhos graves e temores,

Alcançam os que são de fama amigos

As honras imortais e graus maiores”…

Cabe a cada homem escolher o seu percurso de vida, fazendo valer a sua própria vontade.

A Organização