sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Seminário "Aprender a ler - ler para aprender"

Agrupamento de Escolas partilha

em Santarém experiências de leitura

Um grupo de nove alunos representou o Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca no Seminário “Aprender a ler, ler para aprender”, que se realizou em Santarém, no dia 26 de fevereiro.

Promovido pelo Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), o seminário reuniu especialistas que debateram questões como a fluência leitora, os hábitos de leitura dos alunos portugueses, e ainda o papel da escola na aprendizagem e na promoção da leitura.

Convidada para animar um momento de leitura, a delegação de Ponte da Barca apresentou o projeto “Leituras e Companhia”, um programa semanal produzido pela Biblioteca Escolar (BE) para a “Barca FM” (99.6), e promoveu uma breve sessão de leitura.

Valentim Cerqueira, do 8.º ano, partilhou a sua experiência como utilizador da BE, realçando as dinâmicas e as metodologias implementadas na produção do programa, uma iniciativa que arrancou em novembro de 2012 e que, de uma forma ininterrupta, mesmo em período de férias, vai para o ar aos sábados, entre as 12 e as 13 horas.

Seguiu-se um momento de leitura, com sete alunos do 1.º ciclo da EB Diogo Bernardes (Gabriela Gomes, Matilde Cerqueira, Milene Fernandes e Salvador Ferreira, do 2.º ano; Gonçalo Oliveira, do 3.º ano; e Dinis Ferreira e Pedro Ribeiro, ambos do 4.º ano) a lerem poemas de Camões e de Manuel Parada. Por sua vez, Matilde Pimenta, do 8.º ano, interpretou o “Cântico Negro”, de José Régio.

A excelência do desempenho do grupo de alunos do Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca e a qualidade do trabalho desenvolvido mereceram múltiplas felicitações, com a plateia a levantar-se para um aplauso geral aos intervenientes na sessão.

Biblioteca Escolar  

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

À descoberta da vida 

e da obra do Poeta

“À descoberta de Luís Vaz de Camões” foi o tema de uma sessão dinamizada pela Biblioteca Escolar com cada uma das turmas do 2.º Ciclo do Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca.

O trabalho, desenvolvido em articulação com Apoio ao Estudo, aconteceu no âmbito das comemorações do V centenário do nascimento de Camões e, como é óbvio, procurou dar a conhecer os aspetos mais relevantes da vida e da obra do nosso épico, proporcionando um contributo para uma melhor compreensão do “Desfile de Carnaval” que, este ano, se inspira na figura e na criação artística do Poeta.

Num registo informal e muito próximo, os alunos entraram numa longa viagem, que começou a 23 de janeiro de 1524, data provável do nascimento do autor d’”Os Lusíadas”, e os conduziu até à atualidade, com início em Lisboa e passagem por Coimbra, Ceuta, pelo vasto Oriente (Goa, na Índia; Ormuz, no Golfo Pérsico – Irão; Ilha de Ternate, nas Molucas, hoje Indonésia; Macau, na China; delta do rio Mecom, no Vietname; Malaca, na Malásia) e pela Ilha de Moçambique, até chegarem, novamente, a Lisboa e à riqueza da sua obra intemporal.

Os mais novos ficaram ainda a saber que Luís de Camões é considerado uma das maiores figuras da Literatura, afirmando-se como símbolo de Portugal, de tal modo que, no dia da sua morte, que ocorreu a 10 de junho de 1580, se celebra o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

Pode aceder aqui ao recurso utilizado nas sessões.

Biblioteca Escolar

terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

Episódio do Velho do Restelo

Mas um velho, d'aspeito venerando,

Que ficava nas praias, entre a gente,

Postos em nós os olhos, meneando

Três vezes a cabeça, descontente,

A voz pesada um pouco alevantando,

Que nós no mar ouvimos claramente,

Cum saber só d'experiências feito,

Tais palavras tirou do experto peito:

 

“Ó glória de mandar, ó vã cobiça

Desta vaidade, a quem chamamos Fama!

Ó fraudulento gosto, que se atiça

Cũa aura popular, que honra se chama!

Que castigo tamanho e que justiça

Fazes no peito vão que muito te ama!

Que mortes, que perigos, que tormentas,

Que crueldades neles experimentas!

 

[…] Não tens junto contigo o Ismaelita,

Com quem sempre terás guerras sobejas?

Não segue ele do Arábio a Lei maldita,

Se tu pola de Cristo só pelejas?

Não tem cidades mil, terra infinita,

Se terras e riqueza mais desejas?

Não é ele por armas esforçado,

Se queres por vitórias ser louvado?

 

Deixas criar às portas o inimigo,

Por ires buscar outro de tão longe,

Por quem se despovoe o Reino antigo,

Se enfraqueça e se vá deitando a longe;

Buscas o incerto e incógnito perigo

Por que a Fama te exalte e te lisonje

Chamando-te senhor, com larga cópia,

Da Índia, Pérsia, Arábia e de Etiópia!”.

Luís de Camões, Os Lusíadas, IV, 94-95; 100-101.


O “Velho do Restelo” constitui um episódio eloquente d’Os Lusíadas, com uma fortíssima mensagem política e filosófica.

Na Praia das Lágrimas, em Belém, no momento em que a armada de Vasco da Gama se preparava para zarpar, Camões coloca na boca de um “velho, d' aspeito venerando,” uma crítica muito forte em relação a tudo o que se está a passar: censura a “glória de mandar” e a “vã cobiça”, responsáveis por “mortes”, “perigos”, “tormentas”, “crueldades”, “desemparos”, “adultérios”, consumição “de fazendas, de reinos e de impérios”.

Pela boca do velho, o narrador aproveita, assim, para questionar a estratégia da expansão marítima até ao Oriente, manifestando, em alternativa, a predileção de determinados setores da sociedade portuguesa pela política africana: “Não tens junto contigo o Ismaelita / Com quem sempre terás guerras sobejas?”.


Esta é também a posição de Camões, apresentada na dedicatória ao rei D. Sebastião e nas estâncias finais d’Os Lusíadas, da nobreza e de uma parte da intelectualidade, na esteira de “Gil Vicente, Sá de Miranda, João de Barros, Damião de Góis ou António Ferreira.”

Ficcionalmente, este episódio acontece a 8 de julho de 1497. Na verdade, foi escrito mais de meio século depois, de tal maneira que, quando Os Lusíadas são publicados, em 1572, esta é uma aposta geoestratégica com muito peso.

À época, as dificuldades na Ásia portuguesa eram gritantes e a instabilidade dominava no Norte de África, situação que nos obrigava a estar muito vigilantes, não só quanto às praças que ainda nos restavam em Marrocos, mas até em relação ao próprio Algarve.

Neste contexto – escreve Isabel Rio Novo –, “o fanatismo do jovem rei e a sua obsessão pelo espírito de cruzada, cuidadosamente alimentada por uma certa franja da nobreza, foram, talvez, uma necessidade do tempo, com a qual Camões estaria essencialmente de acordo. Até porque, de certo modo, o projeto da conquista africana constituía uma possível solução para o beco sem saída em que a Índia se estava a tornar. Era o caminho que o Velho do Restelo apontava, contrapondo à conquista de um império comercial longínquo, consumidor de ‘fazendas’ e de ‘reinos’, a possibilidade de ‘guerras sobejas’ contra um inimigo que estava ali ‘às portas’ e que era urgente combater.”


A expedição acabou mesmo por se realizar. Diogo Bernardes foi escolhido para acompanhar e cantar a vitória dada como certa. Camões também o desejou, mas não o conseguiu. Só que o sonho glorioso redundou na tragédia de 4 de agosto de 1578, em Alcácer Quibir…

“Assim que recebeu a notícia da derrota e da morte do rei, [Camões] rasgou as estâncias que tinha encetado quando a armada de D. Sebastião largara do Tejo. Quanto ao poema de Diogo Bernardes, não chegou a ser começado, porque o autor foi um dos prisioneiros”…

Tempos sombrios da História de Portugal. E também de Luís de Camões e do barquense Diogo Bernardes.

Fonte: Isabel Rio Novo, Fortuna, Caso, Tempo e Sorte – Biografia de Luís Vaz de Camões, Lisboa, Contraponto, 2024, pp. 446, 467 e 544.

A Organização


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Biblioteca da Escola Diogo Bernardes 

vai ser remodelada

O Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca acaba de ver aprovada pela Rede de Bibliotecas Escolares (RBE) a candidatura apresentada no âmbito da modalidade “(re)Criar a Biblioteca”.

A aprovação deste projeto vai permitir uma intervenção de fundo na Biblioteca da Básica Diogo Bernardes, requalificando e reestruturando, de forma inovadora, as diversas áreas de trabalho, mediante a exploração de novas configurações do espaço, assentes na flexibilidade e na portabilidade.

O projeto submetido pela Biblioteca do Agrupamento – em articulação estreita com o Diretor e a Coordenadora interconcelhia da RBE – é um dos 30 aprovados no universo das candidaturas apresentadas a esta modalidade a nível nacional, tendo sido contemplado com o limite máximo do apoio financeiro possível, cerca de 40 por cento acima da média.

Num contexto complexo e de permanente transformação em que vivemos, a BE da Diogo Bernardes, passados 16 desde a sua integração na RBE, sofre, agora, uma remodelação, procurando manter-se atenta aos desenvolvimentos e desafios que a mudança incessante dos formatos, modelos e meios de acesso ao saber traz à aprendizagem escolar.

Com esta intervenção, ao nível do mobiliário e equipamento informático e ainda em termos de reestruturação das áreas funcionais, pretende-se garantir processos e estratégias que permitam à BE recriar novos contextos de aprendizagem e adaptar os seus recursos às efetivas necessidades dos seus utilizadores, facilitando o acesso ao livro, à informação e favorecendo ambientes amigos da construção do conhecimento.

Biblioteca Escolar

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

Ao Conde do Redondo, Vice-Rei da Índia

Aquele único exemplo

De fortaleza heróica e de ousadia,

Que mereceu, no templo

Da eternidade, ter perpétuo dia,

O grão filho de Thétis, que dez anos

Flagelo foi dos míseros Troianos;

 

Olhai que em vossos annos

Produze huma orta insigne várias ervas

Nos campos lusitanos,

As quaes, aquellas doutas protervas

Medea e Circe nunca conheceram,

Posto que as leis da Mágica excederam.

 

[…] O qual está pidindo

Vosso favor e ajuda ao grão volume,

Que agora em luz saindo

Dará na Medicina um novo lume,

E descobrindo irá segredos certos

A todos os antiguos encubertos.

 

[…] Ajudai quem ajuda contra a morte,

E sereis semelhante ao Grego forte.

Luís de Camões, em Garcia de Orta, Colóquios dos Simples e Drogas e Coisas Medicinais da Índia, Goa, Ioannes de Endem, 1563. Disponível em http://purl.pt/22937, acedido em 14.02.2025

Este excerto da ode “Ao Conde do Redondo, Vice-Rei da Índia”, faz parte do primeiro poema de Luís de Camões impresso em letra de forma.

Também conhecido por “Aquele único exemplo...”, constitui o prefácio da obra, à época revolucionária, Colóquios dos Simples e Drogas e Coisas Medicinais da Índia, da autoria do conhecido médico e botânico Garcia de Orta, publicada em Goa, a 10 de abril de 1563, pelo tipógrafo Ioannes de Endem.

Garcia de Orta vivia na Índia há mais de três décadas e, em Goa, desde 1538. Foi aqui que conheceu e travou amizade com Luís de Camões, a quem pediu para prefaciar o seu livro.

O poeta fê-lo com uma ode dedicada ao Conde do Redondo, D. Francisco Coutinho, Vice-Rei da Índia, de quem era próximo, pedindo-lhe, precisamente,

“[…] favor e ajuda ao grão volume,

Que agora em luz saindo

Dará na Medicina um novo lume,

E descobrindo irá segredos certos

A todos os antiguos encubertos”.

“A 5 de novembro de 1562, D. Francisco Coutinho assinou o alvará que concedia a Garcia de Orta os direitos de publicação do livro”, por considerá-lo “muito proveitoso”.

Este é, aliás, um período feliz da vida de Camões no Oriente. Durante o vice-reinado do amigo Conde do Redondo, o poeta conseguiu libertar-se da sua habitual condição de penúria, ao ser nomeado para o cargo de Provedor dos Defuntos em Macau.

Para além da ode que agora nos ocupa, “Ao Conde do Redondo, Vice-Rei da Índia”, que constitui o prefácio da obra de Garcia de Orta (Goa, 1563), durante a vida de Luís de Camões somente foram publicados Os Lusíadas, em Lisboa, em 1572, e mais dois poemas: uma elegia e um soneto, ambos integrando a Historia da Prouincia Sancta Cruz, de Pero de Magalhães de Gândavo, impressa em Lisboa, em 1576. A restante obra do Poeta, nomeadamente, a sua vasta produção lírica, só foi impressa depois da sua morte.

Quanto a Garcia de Orta, faleceu em Goa, em 1568, ano em que Camões inicia o seu conturbado regresso à pátria.

Morreu, mas não descansou em paz! E isto porque, num auto de fé realizado 12 anos depois, Garcia de Orta foi condenado “post-mortem” por judaísmo – os seus restos mortais foram exumados e os seus ossos queimados na fogueira.

Foi em 1580, o ano da morte, em Lisboa, do seu amigo Luís Vaz de Camões…

Fonte: Isabel Rio Novo, “Fortuna, Caso, Tempo e Sorte – Biografia de Luís Vaz de Camões”, Lisboa, Contraponto, 2024, pp. 355-369.

A Organização

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Alunos mais novos debatem 

uso seguro da internet

No âmbito do Dia da Internet Mais Segura, que se assinalou a 11 de fevereiro, os alunos dos 1.º e 2.º anos do Agrupamento de Escolas participaram numa sessão de leitura animada da obra “Kiko e os muitos Eus”, dinamizada por Inês Portocarrero Araújo, da Biblioteca Municipal de Ponte da Barca.

O trabalho, que mobilizou as turmas das Escolas Básicas Diogo Bernardes, em Ponte da Barca, de Crasto e de Entre Ambos-os-Rios, teve como objetivo promover o diálogo com as crianças sobre o uso seguro dos ecrãs, capacitando-as para a utilização do ambiente digital de forma crítica, ética e responsável.

Do debate realizado a partir do livro “Kiko e os muitos Eus”, saíram algumas regras de utilização da internet que mereceram o compromisso dos mais novos: pensar antes de fazer alguma coisa; informar e pedir sempre ajuda aos pais e/ou a adultos amigos; não conversar nem partilhar “coisas” com desconhecidos; saber dizer “Não”.

A iniciativa partiu da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Ponte da Barca, tendo a sua operacionalização sido concretizada com a colaboração da Biblioteca Municipal, em articulação com a Biblioteca Escolar e o Departamento do 1.º Ciclo.

O livro “Kiko e os muitos Eus” é uma publicação do Conselho da Europa e foi criado propositadamente para explicar aos mais novos, de forma simples, as regras para uma melhor proteção da sua imagem e privacidade, quando utilizam a internet.

Recorde-se queDia da Internet Mais Segura se celebra anualmente, no segundo dia da segunda semana do segundo mês, e este ano teve como tema central a “Educação para a Cidadania Digital”.

Biblioteca Escolar

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Promoção das Literacias 

em Saúde Oral e da Leitura

As crianças da Educação Pré-escolar (EPE) e do 1.º Ciclo do Agrupamento de Escolas participaram em mais um ciclo de sessões de promoção da saúde oral.

A ação, que decorreu ao longo dos meses de janeiro e fevereiro, envolveu as 27 salas/turmas a funcionar nas Escolas Básicas Diogo Bernardes, em Ponte da Barca, de Crasto e de Entre Ambos-os-Rios e foi dinamizada pela Biblioteca Escolar, pela equipa de Saúde Escolar da UCC de Ponte da Barca e ainda pela Unidade de Saúde Pública do Alto Minho (ULSAM), em articulação com os departamentos da Educação Pré-escolar e do 1.º Ciclo.

Com o objetivo da promoção transversal da saúde oral, da autoestima, bem-estar e saúde mental positiva, e também do gosto pelo livro e pela leitura, o trabalho conheceu um primeiro momento com a Biblioteca Escolar a dinamizar a leitura expressiva da estória “Pedro e a Pasta de Dentes”, que consta do livro digital “SOBE+ NA BARCA”, que a BE editou em suporte digital, no ano letivo 2022/2023.

Seguiu-se uma animada conversa de educação para a saúde oral, com a enfermeira Alexandrina Rodrigues, da equipa de Saúde Escolar da UCC de Ponte da Barca, a interagir com os miúdos acerca dos cuidados para manter “dentes fortes, saudáveis e bonitos”.

Ao mesmo tempo, aconteceu também a aplicação de verniz de flúor às crianças da EPE, pela Higienista Oral Ângela Ferreira, da ULSAM, com o apoio da enfermeira Sónia, da equipa de Saúde Escolar da UCC de Ponte da Barca.

O interesse e envolvimento dos miúdos nas atividades constituem um excelente indicador quanto ao seu compromisso na adoção de comportamentos amigos da saúde oral.

Biblioteca Escolar

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES

Ah! minha Dinamene! Assim deixaste

Ah! minha Dinamene! Assim deixaste

Quem não deixara nunca de querer-te!

Ah! Ninfa minha, já não posso ver-te,

Tão asinha esta vida desprezaste!

            Como já pera sempre te apartaste

            De quem tão longe estava de perder-te?

            Puderam estas ondas defender-te

            Que não visses quem tanto magoaste?

Nem falar-te somente a dura Morte

Me deixou, que tão cedo o negro manto

Em teus olhos deitado consentiste!

            Oh mar! oh céu! oh minha escura sorte!

            Que pena sentirei que valha tanto,

            Que inda tenha por pouco viver triste?

Luís de Camões, Lírica (fixação do texto de Hernâni Cidade), 

Lisboa, Círculo de Leitores, 1980, p. 230.

Este soneto sobejamente conhecido expressa a profunda dor do sujeito poético pela perda de Dinamene, a sua amada, que morreu prematura e inesperadamente, a ponto de nem ter sido possível uma despedida: “Nem falar-te somente a dura Morte / Me deixou”.

Perante a separação definitiva, questiona o destino, o mar e a morte, que o privaram até mesmo de uma despedida, e realça que a saudade e o sofrimento causados por essa perda são tão intensos, que nenhuma tristeza parece suficiente para expressar a sua desolação, questionando-se se valerá a pena uma vida miserável, sem a sua amada.

Quem é Dinamene, aqui evocada pelo poeta?

São várias as interpretações que têm sido apresentadas “quanto à identidade deste nome, inclusivamente a de que corresponderia a uma das ninfas do mar, a que se referem vários escritores da Antiguidade”. Mas uma forte tradição biográfica de Camões, ainda que de contornos um pouco lendários, identifica-a como “uma jovem chinesa que teria perecido num naufrágio, no rio Mecom”.

No regresso de Macau a Goa, com escala em Malaca, Camões sofreu, de facto, um naufrágio, provavelmente perto do delta do rio Mecom, e perdeu quase tudo.

“Como escreveram os biógrafos antigos, Camões conseguiu salvar-se numa ‘tábua’, que tanto pode ter sido um bote como um pedaço de madeira convertido em jangada improvisada. Severim de Faria acrescentou que o Poeta tinha escapado a nado, rasgando as água com uma mão e segurando o manuscrito de Os Lusíadas na outra” (Isabel Rio Novo).

E assim nasceu no imaginário nacional a figura heroica do Poeta, lutando para salvar uma obra que vale por uma literatura. Mas, neste “naufrágio triste e miserando”, como lhe chama na estância 128 do canto X, perdeu tudo o resto. Perdeu os bens que conseguira amealhar em Macau, onde tinha exercido as funções de Provedor dos Defuntos; perdeu o espólio dos defuntos à sua guarda; e perdeu a sua querida Dinamene, por quem chora neste soneto e em vários outros poemas…

Chegado, finalmente, a Goa, por volta de 1565 ou 1566, acabaria por ser acusado e condenado ao cárcere. Escreve Isabel Rio Novo que tudo indica que “não acreditaram que o naufrágio fosse a razão pela qual Camões não entregava os bens dos defuntos e por isso o prenderam”.

O Poeta ficou indignado com a injustiça. No meio de tantas agruras, só lhe resta a sua obra poética. E o desejo de a publicar.

A partir de agora, só pensa em regressar à pátria…

Fontes: Porto Editora – Dinamene na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-02-07 09:16:47]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$dinamene

Isabel Rio Novo, Fortuna, Caso, Tempo e Sorte – Biografia de Luís Vaz de Camões, Lisboa, Contraponto, 2024, p. 387.

A Organização


terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE CAMÕES


“(…) um bicho da terra tão pequeno?”

(…) Oh! Grandes e gravíssimos perigos,

Oh! Caminho da vida nunca certo,

Que, aonde a gente põe sua esperança,

Tenha a vida tão pouca segurança!

 

No mar, tanta tormenta e tanto dano,

Tantas vezes a morte apercebida;

Na terra, tanta guerra, tanto engano,

Tanta necessidade aborrecida!

Onde pode acolher-se um fraco humano,

Onde terá segura a curta vida,

Que não se arme e se indigne o Céu sereno

Contra um bicho da terra tão pequeno?

Luís de Camões, Os Lusíadas, I, 105-106

A narração n’Os Lusíadas principia com a armada de Vasco da Gama a meio da viagem (in medias res), já a chegar à Ilha de Moçambique, onde faz escala para se abastecer.

A partir daqui, assiste-se a um conjunto de atribulações, com ciladas, falsidades e traições que quase deitam tudo a perder, não fora a intervenção de Vénus.

Na Ilha de Moçambique, o chefe local, quando verifica, inspirado por Baco, que os Portugueses são cristãos, resolve destruí-los. E Gama, depois de ter sido atacado, traiçoeiramente, é enganado e recebe a bordo um piloto, com ordens para levar a armada a cair numa cilada.

Ao aproximarem-se da perigosa zona de Quíloa, Vénus afasta-os da costa por meio de “ventos contrários”, anulando, assim, a traição. O piloto mouro ainda faz outras tentativas, mas Vénus está atenta e impede que isso aconteça. A viagem continua para Norte e chegam à cidade de Mombaça, cujo rei fora avisado por Baco para os exterminar.

Face a tantas traições e a tantos perigos – ciladas, hostilidade disfarçada que ilude e alimenta esperanças –, o poeta não resiste a uma reflexão.

Termina o primeiro canto com uma consideração sobre a imprevisibilidade e a insegurança da vida e a fragilidade da condição do ser humano, “um bicho da terra tão pequeno”…, exposto a todos os perigos e incertezas e vítima indefesa do “Céu sereno” (I, 106).

Os perigos espreitam o ser humano (o herói), tão pequeno diante das forças da natureza, do poder da guerra e dos traiçoeiros enganos dos inimigos. Estamos no início da epopeia. Ver-se-á, no último canto, o décimo, até onde a ousadia, a coragem e o desejo de ir sempre mais além podem levar o “bicho da terra tão pequeno”…

Ilustração de Lima de Freitas, em Luís de Camões, Lírica,
Lisboa, Círculo de Leitores, 1980, p. 467.

Curiosamente, Camões repete este verso emblemático na canção “Junto de um seco, fero e estéril monte”, em que o sujeito poético reflete sobre a sua própria condição:

(…) Somente o Céu severo,

As Estrelas e o Fado sempre fero,

Com meu perpétuo dano se recreiam,

Mostrando-se potentes e indignados

Contra um corpo terreno,

Bicho da terra vil e tão pequeno. (…)

Quase cinco séculos passados, Camões continua intemporal, vivo e inspirador na análise da condição humana, na sua insegurança, fragilidade e contingência.

No século XVI e nos dias de hoje, Camões embarca Engenho e Arte!

A Organização